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COMO A FICÇÃO TELEVISIVA MOLDOU UM PAÍS

A presente pesquisa se propôs a traçar uma história cultural da telenovela brasileira, compreendendo-a como a experiência comunicacional, estética e social que, em nosso contexto, melhor caracterizou uma narrativa da nação (LOPES, 2009) nos últimos 60 anos. Procuramos verificar de que modo melodrama e brasilidade se articularam no panorama teleficcional desse período. Para isso, consubstanciamos problemáticas teórico-epistemológicas do campo da Comunicação a parâmetros provenientes da História e dos Estudos Culturais. Partimos, primeiramente, de um “voo noturno” na diacronia do melodrama, tateando suas formas de apreensão e transformação do final do século XVIII a meados do século XX. Em seguida, arquitetamos uma estratégia metodológica que nos permitiu vislumbrar a espacialidade como a principal variável teórica e empírica no engendramento de análises socionarrativas das ficções televisivas. Nossos dados primários foram compostos por 677 telenovelas diárias exibidas entre 1963 e 2020. Identificamos quatro constructos espaciais predominantes nessas produções: a cidade de São Paulo; a cidade do Rio de Janeiro; o interior do Brasil; e o exterior. Cruzamos essas informações com as periodizações propostas por Hamburger (2005) e Lopes (2003a, 2009) para o processo histórico da telenovela brasileira – o que nos levou, inclusive, a refletir acerca da emergência de uma nova fase nas cronologias delineadas pelas duas pesquisadoras. Munidos deste referencial, dedicamo-nos a um passeio (ECO, 1994) pela história da ficção televisiva nacional com o objetivo de prospectar o entrecruzamento entre telenovela, cultura e sociedade. Nossa jornada foi dividida em quatro fases: (I) fantasia ou sentimental (1963 a 1968); (II) nacional-popular ou realista (1968 a 1990); (III) de intervenção ou naturalista (1990 a 2015); e (IV) neofantasia ou neossentimental (2015 à atualidade). Selecionamos, ainda, uma produção de cada fase para a realização de estudos de caso que contemplassem as quatro ambientações espaciais assinaladas anteriormente. Essas produções foram: Antônio Maria (Tupi, 1968); Roque Santeiro (Globo, 1985); O Clone (Globo, 2001); e Os Dez Mandamentos (Record, 2015). Constatamos que a telenovela brasileira, no decorrer de sua formalização, se apropriou da densidade geocultural do país, fazendo com que o melodrama orquestrasse experiências estéticas e emocionais capazes de reorganizar sentidos circulantes na arena das representações da identidade nacional. Não raro, essa dinâmica ocorreu devido à intersecção entre o espaço-tempo das narrativas e o espaço-tempo dos processos sociais. Ao mesmo tempo, a mestiçagem que, a partir de Martín-Barbero (2003), podemos atribuir à relação entre melodrama e brasilidade, entre as novas tecnologias e dispositivos mais tradicionais de narração e reconhecimento, não deixou de operar uma violência simbólica por perpetuar, na ficção televisiva, estigmas e padrões de exclusão observados em outros ramos da cultura.

COMO A FICÇÃO TELEVISIVA MOLDOU UM PAÍS

R$ 0,00Preço
  • ISBN 978-65-5029-039-9

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